Acessos e revoluções

Acessos e revoluções

Por: Clarice Uli

Ter acesso aos meios mais complexos de conhecimento é um desafio constante para jovens que residem em áreas periféricas ou possuem recursos limitados para acessá-los.

Até mesmo a internet possui os seus meios de restrição, seja por questões relacionadas à direitos autorais, seja por intenções de comercializar aquele conhecimento, esteja ele em formatos de livros, filmes ou qualquer outro tipo de acervo.

Durante toda a minha infância e adolescência, vivi em aglomerados ou zonas periféricas da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Inserida em um contexto cultural cuja violência e escassez de informação faziam parte daquela realidade de forma comum e naturalizada.

Me lembro então de me fechar em bibliotecas das escolhas em que estudei, cujo acervo era bastante limitado, além de me inscrever em todas as bibliotecas públicas possíveis, passando horas em ônibus e praças, a fim de ler algum livro ou conseguir alguma informação específica.

Após me tornar uma pessoa adulta e me inserir no contexto acadêmico, em uma instituição privada, e por isso com uma enorme quantidade de pessoas negras e pobres, pude perceber a discrepância e as consequências que a falta de acesso ao que para as pessoas privilegiadas estiveram sempre à mão, resultavam em um abismo que vinha à tona durante debates e discussões, assim como nos resultados das avaliações e nos progressos acadêmicos em geral.

Ter me fechado em bibliotecas durante grande parte da minha vida me trouxe consequências peculiares, como a minha dificuldade com as interações sociais, inserções em grupos ou a continuidade de relações de amizade efetivas e duradouras, sendo diagnosticada aos 17 anos com a boa e velha Fobia Social.

Obviamente, o tratamento me auxiliou de maneira surpreendente. Mas este não é o foco deste texto, e sim até quando o saber estará limitado à apenas uma parcela da população, enquanto a outra vive em um mundo cultural à parte, muitas vezes sem a oportunidade de ao menos ter a consciência de que novas formas e mudar a sua realidade são possíveis.

O objetivo deste texto não é trazer uma conclusão ou a resolução de um problema tão enraizado, mas nos possibilitar o pensamento sobre o que nós, individualmente, podemos fazer pelo outro. Posso dar-lhe um livro já lido e que provavelmente ficará empoeirado em minha estante? Posso contar-lhe sobre a história e a filosofia das diversas partes do mundo e como todos estes pensadores podem dar-lhe inspiração para que a sua própria realidade se transforme, através de novas maneiras de agir e pensar?

Eu espero que este texto atinja pessoas capazes de acreditar em um futuro revolucionário, mesmo quando tudo ao nosso redor conspire para que ele caminhe para uma opressora regressão.

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